domingo, 1 de maio de 2011

BRINCADEIRINHA DE SUSTO


02. Coisa de família

Vovô Jesus já fazia das dele. Cansei de tirar as bolinhas de alumínio das embalagens de Magnésia Bisurada de dentro da camisa ou das calças que o pai da minha mãe colocava furtivamente. Outra clássica era fazer um rolinho com supracitado aluminiozinho e riscar o pé da gente quando a gente já está deitado na rede. Ainda vejo o sorriso dele com os olhinhos apertados no rosto do Tio Roberto, outro legítimo descendente de assustadores de ocasião.

Mamãe conta uma que ele aprontou, com a conivência dela, claro. Nesta época morávamos em São Luís numa casa projetada pelo meu pai. Uma casa relativamente grande, principalmente pra alguém que como eu tinha por volta de um metro de altura. Ela tinha três níveis: no inferior, nível do quintal, garagem acessada por rampa da rua até o lado da sala de jantar, cozinha e serviço; jardins, acesso de pedestre, sala de estar e lavabo no nível da rua; e quartos e banheiros no nível superior. Quando a noite caía, nos reuníamos todos na sala de jantar onde ficava a TV. Papai chegava do trabalho e nos escondíamos pra não ir buscar seus chinelos no seu quarto, o último do corredor, duas escadas depois, morrendo de medo do escuro que reinava no resto da casa deserta. Esse medo contagiou a “póbi” da secretária que vou chamar aqui de Toinha (não me lembro o nome dela). Na noite fatídica, o Tio Roberto, então com pouco mais de vinte anos, planejou a peça. Toinha, me arranja um copo d’água gelada e depois pega lá em cima os meus chinelos. Prestativa, ela foi cumprir a primeira tarefa. Tio Roberto sobe ao quarto de minha mãe, coloca o chapéu de Bumba-meu-Boi de minha irmã, que era adornado por um espelho no meio da testa e umas fitas barulhentas caindo dos dois lados. E lá ele fica nas sombras esperando a Toinha que vem devagarzinho e olhando torto pros lados. Toiiiiinhaaaaa! Sacode a cabeça, as fitas chacoalhando, o espelho brilhando no escuro. A moça pára olhando pra ele. E lá fica. Estática. Muda. Pálida. Não dá um pio. Toinha, sou eu, o Roberto! nervoso com o estado dela. Nada. Marúsia, acode que a mulher surtou! Água com açúcar, senta a moça, tapinha no rosto e tudo bem. No dia seguinte ela pediu pra ir-se embora. O susto saiu pela culatra.

Nenhum comentário:

Postar um comentário