domingo, 8 de maio de 2011

MINHA PÃE E MEU(S) PAI(S)


Em homenagem ao dia das mães resolvi contar mais um pouquinho da minha história. A participação da minha mãe como pilar central de minha família é decisiva na formação de meu caráter e personalidade. Contar o que passamos é uma homenagem que faço à mãe inigualável que ela foi. Daí, vou falar também de todas as figuras paternas que tive com a distância do meu pai biológico. Como tudo isso dá um livro, vou escrever aos poucos, tentar colocar em ordem cronológica o resumo da epopéia que eu passei com ela e meus irmãos depois do divórcio dos meus pais.

01. Maturidade antecipada

Quando eu tinha 6 anos meus pais se separaram e eu nem notei.

No meu pequeno universo não percebi que aquilo ia acontecer e ninguém me disse que minha mãe tinha viajado pra Fortaleza definitivamente levando  ngela (9) e Mariana (2). Não sei dizer o dia exato, nem o mês, mas data aqui é o que menos importa.

Antes que achar que esta falta de lembranças específicas é um problema, eu tenho que dar os créditos aos meus pais. Suas brigas não me alcançaram. A transição foi tranqüila e natural. Mamãe veio de São Luis com as meninas no começo do ano e ficamos eu e Alexandre com o Papai até o meio do ano.

Foi uma época estranha. Outro dia mesmo me recordava das canjiquinhas que o papai fazia, das caixas tetra-pak da Parmalat que tinham uma promoção pra ganhar um macacão do Nelson Piquet na Brabham ou com fotos de crianças desaparecidas, do Toddy sabor banana (eu adorava aquilo!), do chiclete Ping-Pong no formato do cartão de futebol que vinha com ele, e por aí vai.

A vida confortável que nós tínhamos desapareceu por completo quando viemos morar em Fortaleza. Mamãe morava com os pais dela e as duas meninas. Eu e Alexandre alternávamos entre as casas de meu avós paternos e maternos. Só começamos a morar os cinco juntos, minha mãe e os quatro filhos, depois que eu adoeci de Hepatite.

Naquele momento eu estava morando na casa da Vovó Valderez, mãe de meu pai. A família inteira do lado dele cortara relações com minha mãe. As acusações eram muitas, todas advindas de um conjunto de preconceitos (as separações ainda eram mal vistas) e da cumplicidade da família com meu pai, o abandonado pela mulher. Não posso esconder que me doía ouvir os adultos falando dela ou de nós. Repetidas vezes disseram que eu e Mariana não éramos filhos de meu pai, mas frutos dos “amantes” da mamãe. Não guardo mágoas. Acreditando ou não que eu fosse da família, sempre me trataram como se fosse, e o amor que minha avó demonstra quando me vê anula tudo o que um dia eu a ouvi dizer.

Mamãe foi me buscar lá quando eu caí doente e me levou pra fazer os exames necessários. Confirmada a hepatite, nos mudamos somente eu e a mamãe para um apartamento de três quartos na Av. Aguanambi. A mobília podia ser resumida assim: uma cama em que eu dormia na suíte (mamãe dormia em uma rede ao meu lado); um estrado perto de meus pés, onde ficava uma TV 14” preto-e-branco; um frigobar e um fogão duas bocas na cozinha; e não me lembro de mais nada.

Foi nesta cama que comemorei os meus 8 anos de idade. Se não bastasse a hepatite ainda arranjei um baita de um tumor na coxa que passei anos conseguindo divisar a cicatriz; como eu passava o tempo todo deitado, isso era um complicador. Mamãe trouxe um bolo de chocolate com velinha acesa enquanto Vovô Jesus, Vovó Rosália,  ngela, Alexandre e Mariana cantavam os parabéns mantendo certa distância pra evitar o contágio. Ela escondeu o rosto quando começou a chorar e eu engoli o meu pra ela não notar o quanto eu estava triste. Naquele dia fiquei mais velho dez anos.

Meus aniversários eram sempre bem animados (com exceção do último antes da separação, que soprei a vela enterrada no arroz) e cheio de brinquedos legais. Desta vez, meus avós me deram um conjuntinho de linha ou lã (só sei que coçava o diabo!) com um calção marrom sem detalhes e uma camisa pólo do mesmo marrom com amarelo (tipo o Charlie Brown);  ngela trouxe um robozinho plástico amarelo de uns 10 cm que atirava pequenos mísseis das mãos quando apertávamos um botão nas suas costa; Alexandre me deu um carro de corrida também de plástico que encaixa em sua traseira um balão de aniversário, era só encher e soltar que o carrinho saía correndo; Mariana, um fusquinha desmontável de uns 5 cm; mamãe me deu uma resma de papel e uma caixa de lápis de cor que foram toda a minha diversão no mês que passei acamado. Lembro que não desenhava mais desde a vinda pra Fortaleza e voltei com toda força a partir daí. Acho que ganhei vários outros presentes, mas além destes, só me lembro dos dois exércitos plásticos (um verde, brasileiro, outro cáqui, vietnamita), como aqueles de Toy Story, que a Tia Taís me deu e que eu brincava em cima do gamão do Vovô.

Recuperei-me da doença na casa dos meus avós, numa cama centenária que a mamãe guarda até hoje. Minha alimentação básica era arroz-de-leite com carne picadinha. Ainda ganhei uma solitária de bônus(!) facilmente debelada com os remédios corretos.

Não lembro em que momento nós voltamos pro apartamento, com as outras crianças desta vez. Estudávamos de graça no Colégio Rachel de Queiroz. Os donos, o Tio Fleury e a Tia Maria, eram compadres dos meus pais, padrinhos da  ngela. O colégio era do outro lado da avenida onde moramos juntos aí até 1985, quando Alexandre foi morar em Manaus com o Tio Roberto; seis meses depois fui eu também. Nesta época, a mamãe precisou de ajuda pra nos sustentar. Mas esta é outra história, ou post!

4 comentários:

  1. Putz, complicado pra quem fica no meio dessas balas cruzadas familiares. Cosequência disso, admito que não lembro de até hoje ter conseguido dizer um "Oi" pra tua mãe, mesmo gostando tanto de todos os filhos dela. Se bem que pra ser justo néao posso chamar o que tenho com o tio Màrio uma relação pròxima. Vai entender...
    Ja me olharam torto quando disse isso uma vez, mas repito: Acho que a vovò virou uma pessoa melhor depois da doença! Não por ela perder noção de tudo, mas acho que ela largou de lado todas as cargas emocionais que uma vida familiar catòlicanordestinadoseculopassado implicavam nela. Eu sei que é triste, mas não lembro de vê-la sorrindo quando era mais novo... ao menos isso mudou.

    Abss

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  2. Yuri, véio. Sabes que fomos criados quase como irmão, né. Tu eras bem pequeno mas a vovó só protegia o coração dela tomando o partido do papai. Ela sempre teve um grande coração e todas as outras reações são típicas desta cultura antiquada de vovós. Bom te ver por aqui. Leia o Brincaderinha de Susto que falo de ti lá. Abração.

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  3. Mamãe disse: -Entra no blog do Baxim que tu vai chorar de rir!
    E eu chorei, mas não de rir...
    Ver pelo olhar do outro que lembranças não machucam só a gente é algo realmente embaraçoso...

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